Carnaval é o sobrenome dele: Ailton Santana, o Mestre Bucha. Nessa época do ano ele trabalha dobrado: canta e toca os melhores sambas com o Trio Raiz, apresenta eventos da programação oficial de Poços de Caldas e ainda vai até São Paulo (SP), a convite da Unidos de Vila Maria, para colaborar na condução da bateria.
Desta vez, fica faltando o desfile com a Saci-Pô, cuja bateria tem uma coleção de notas 10 sob liderança do Mestre Bucha. Afastado por divergências internas, ele diz que é “só gratidão” quando o assunto é a agremiação que ajudou a fundar.
Na verdade, ele não ligava para Carnaval antes de começar a se envolver com a Saci-Pô, ainda na criação do bloco que originou a escola. Ele lembra que não participou do primeiro desfile porque não tinha dinheiro para comprar a fantasia, mas que mesmo assim trabalhou na organização.
Mãe e pai
Antes disso, já era um músico talentoso e dedicado. Seu primeiro contato com a percussão foi em uma festa de Cosme e Damião, aos cinco anos, acompanhado pela mãe Dona Mercedes. Foi ali que ele sentiu as vibrações do atabaque e teve a primeira oportunidade de bater a mão no couro do instrumento.
Mercedes também levava o filho para os ensaios da escola de samba Centenário, que aconteciam na rua Junqueiras, no espaço onde hoje é um estacionamento, ao lado do Banco Itaú. “Só lembro da batucada, mas já amava instrumentos e ficava curioso”, conta.
O pai dele também é músico, mas a influência neste caso é mais genética do que de criação. Isso porque Seu Osvaldo deixou a família ainda quando Bucha era criança. Depois disso o jovem teve poucas notícias do pai, mas sempre teve vontade de conhecê-lo pessoalmente. “Minha mãe era uma pessoa muito sábia, nunca falou nada de mal do meu pai, sempre elogiou”, observa.
Com o passar do tempo, Bucha conheceu irmãos, que moravam em Santos (SP) e também tinham sido abandonados pelo mesmo pai. Eles acabaram vindo para Poços de Caldas e, trabalhando na Saci-Pô, puderam conviver de perto com o irmão poços-caldense.
Quando decidiram procurar o pai, conseguiram um número de telefone. Quem ligou, com um misto de coragem e nervosismo, foi Bucha.
Ainda nesta ligação, Bucha conheceu outra irmã e ficou sabendo que tinha ainda mais um irmão. De filho único, passou a fazer parte de uma grande família. Eram cinco: Ailton (Bucha), Rose, Júnior, Helen e Carlos.
Ele conta que nunca questionou o pai sobre os motivos que o fizeram partir. Osvaldo morava no Mato Grosso, mas também passava algum tempo na casa da filha Helen, em Tanabi, cidade paulista próxima a São José do Rio Preto.
O encontro presencial finalmente aconteceu em 2014. Bucha convidou o pai para vir a Poços de Caldas e conhecer os netos, Bruno e Ailton. A chegada foi surpresa e o encontro chamou atenção dos moradores da rua Barão do Campo Místico.
“São muitos anos esperando, mas a vontade que a gente tinha, e temos, de poder abraçar o nosso pai, era muita”, declarou emocionado na ocasião, em entrevista para a TV Poços.
Antes de encerrar este trecho da reportagem, é importante citar que Bucha parece ser um ótimo pai. Fala com carinho e orgulho dos filhos, que também são seus parceiros de samba.
Futebol
Poucos sabem, mas Ailton Santana era um promissor jogador de futebol. Ele começou a treinar ainda criança nas categorias de base da Caldense, com um incentivo especial, do técnico Mané da Pinta.
Mané também era responsável pela casa de máquinas das Thermas Antônio Carlos, na década de 1970. Bucha frequentava o local porque estava sempre acompanhando o vendedor de laranjas chamado por ele carinhosamente de Vô Mário, marido de Mãe Dita. O casal cuidava dele quando não ia para escola por conta das suspensões que levava. “Eu não era mal educado, mas fazia bagunça”, comenta sorrindo.
Voltando ao futebol, Bucha era um bom lateral direito. Aliás, talvez não fosse tão promissor. “Dava voadora, eu era meio enfezado”, diz.
Ele chegou a jogar profissionalmente, ganhando salário, mas acabou deixando o esporte e se dedicando à música.
Silvio Santos
Outra vertente profissional do Mestre Bucha é o canto. Naturalmente afinado, decidiu se inscrever para o programa de calouros do Silvio Santos enquanto fazia compras em São Paulo para a Saci-Pô.
Ele entrou na fila da inscrição e, ainda no teste, chamou atenção do Maestro Zezinho. Em seguida, recebeu da produção do Show de Calouros o dinheiro das passagens para voltar à capital na data marcada e gravar o programa.
Bucha lembra que Silvio Santos tratava os calouros com educação e respeito. Antes de começar, o apresentador cumprimentava todos os participantes: “Esse programa faz sucesso por causa de vocês, obrigado”, dizia Silvio.
Na hora de chamar o calouro, Silvio errou o nome e anunciou o candidato “Ilton”. Bucha entrou rindo, explicou que o correto era Ailton e já aproveitou o clima descontraído para se acalmar antes da apresentação. “As pernas estavam tremendo”, lembra.
Aprovado por nomes como Décio Piccinini e Pedro de Lara, Bucha se destacou entre os concorrentes. Depois, ainda foi premiado nos programas de Raul Gil e Bolinha, que também tinham quadros de calouros.
No mundo da música, Bucha não deixou o talentoà frente dos estudos. Dedicou-se a aprender percussão e estudou sobre Carnaval na Universidade Estácio de Sá, com nomes como Milton Cunha, entre outros cursos.
Amigo pessoal de Neguinho da Beija-Flor, Bucha é um mestre de bateria dos melhores. Nesta trajetória de mais de 50 anos, formou outros mestres e hoje se orgulha de todos seus aprendizes. o livro desta vida continua sendo escrito,
É claro que a história dele tem outros episódios, mas não dá pra contar tudo em uma única reportagem. Ainda tem mais: afinal Bucha tem muito a contribuir para o Carnaval e para a cultura de Poços. Por enquanto, só resta agradecer: obrigado, Mestre!